terça-feira, 30 de dezembro de 2008

LISTÃO DA FURG!!!



Ao vencedor, as batatas!!! Hehehehe.
Se tudo deu certo, PARABÉNS AOS APROVADOS!!! Se não foi desta vez, saiba que o resultado do nosso trabalho nem sempre se reflete em aprovação, mas com certeza sabemos o quanto lutamos para chegar até aqui e o quanto isso foi importante para o nosso crescimento.

Um grande abraço a todos!

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

A Rosa do Povo - Resumo, Análise e Guia de Leitura

Saudações a todos!

Este é um dos últimos posts do ano, e traz um material que eu já tinha colocado aqui no blog. Trata-se de um guia para "A Rosa do Povo", de Drummond. Considerada por muitos a grande obra do maior poeta brasileiro de todos os tempos, A Rosa do Povo se insere na fase da poesia social do autor, profundamente afetada pelo momento histórico: Segunda Guerra Mundial e Era Vargas são referências indiscutíveis.

Cabe destacar a multiplicidade técnica e temática da obra, que vai do soneto ("Áporo") ao verso livre, demonstrando a maturidade da chamada Geração de 30 em relação aos radicalismos do pessoal de 22. Se Oswald de Andrade e companhia privilegiaram uma revolução estética, Drummond foi revolucionário sob o ponto de vista ideológico. Assim como Graciliano Ramos, Jorge Amado, Rachel de Queirós,Erico Verissimo e Cyro Martins no chamado Romance de 30.

Assim, para Drummond a bandeira do socialismo e a luta contra todas as formas de opressão são o cerne da poesia; a forma segue de forma coerente o conteúdo.

Ao estudo!

Resumo e Análise:

10 A ROSA DO POVO



Guia de Leitura:

domingo, 28 de dezembro de 2008

Concerto Campestre - Resumo e Análise

Esta obra já foi comentada aqui no blog há alguns dias, dê uma olhada nos posts anteriores. Fizemos uma leitura comparativa entre o lvro e o filme e coloquei também um guia de leitura em Power Point.

Bueno, o Concerto Campestre, do gaúcho Luiz Antonio de Assis Brasil, é um romance obrigatório para os vestibulares da UFRGS e da UFPel, e outras obras do autor já foram exigidos nos vestibulares da FURG. Isso mostra a importância desse escritor no cenário das letras gauchas contemporâneas.

Ao estudo!

13 Concerto Campestre



GOSTOU DO LIVRO? JÁ LEU OUTRAS OBRAS DO ASSIS BRASIL? DEIXE AQUI SEU COMENTÁRIO!

sábado, 27 de dezembro de 2008

O Que é Isso, Companheiro? - Resumo

Mais uma leitura obrigatória da UFPel. Trata-se de uma obra de caráter memorialístico em que o autor, Fernando Gabeira, relata episódios da luta contra a ditadura militar no Brasil desde 1964 (golpe), passando por 1968 (AI-5), até meados da década de 1970. Como relato, o texto se articula de maneira informal e não se constitui como uma obra literária convencional. São dezesseis capítulos, sendo que os quatorze primeiros ocupam praticamente a metade da narrativa, sendo o restante, o ápice do livro destinado aos capítulos 15 e 16, em que temos, respectivamente, o seqüestro do embaixador norte-americano e os momentos vividos por Gabeira durante sua prisão.

Vale lembrar que 2009 marca os 30 anos da Lei da Anistia e também da publicação do livro.

Além desses fatos, a leitura é interessante por mostrar um momento tão marcante de nossa história sob um ponto de vista diferente do discurso oficial: o ponto de vista de quem participou dos fatos.

Ao estudo!

12 O que é isso



Além desse resumo, indico a vocês um artigo interessante:

"O Astro da Anistia"

Boas leituras, pessoal!

sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Amar, Verbo Intransitivo - Resumo e Análise

Outra obra selecionada para o vestibular da UFPel. Romance de Mário de Andrade, está inserido na fase heróica do Modernismo brasileiro (Geração de 1922). Questiona, portanto, o romance tradicional, o que se evidencia nas constantes intromissões do narrador-autor, nas inovações no terreno da linguagem (como sugere o próprio título) e em estranhezas como a palavra "fim" antes do término da narrativa. Dentro desse espírito modernista nacional, também promove uma reflexão sobre a brasilidade, a partir da oposição entre os valores nativos e os valores eurpeus representados por "Fraülein".

Aos estudos!

9 Amar Verbo Intransitivo



E aí, o que achou do livro? Deixe aqui seu comentário!

quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

Noite na Taverna - Resumo e Análise

Já comentamos aqui no blog a obra de Álvares de Azevedo (ver arquivo). Noite na Taverna é uma das leituras obrigatórias para o vestibular da UFPel. Segue o material para estudo.


2 noitenataverna



Clique aqui para baixar o livro completo.

O QUE VOCÊ ACHOU DE NOITE NA TAVERNA? DEIXE AQUI SEU COMENTÁRIO!!!

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Feliz Natal a Todos


Nesses dias em que tenho andado pelas ruas, vejo as pessoas errando pelas calçadas e avenidas, olhares perdidos em um horizonte infinito... é o Espírito de Natal que nos invade, que nos transforma.

Então aqui vai um poeminha de José Paulo Paes que sintetiza o nosso momento natalino.

Ao shopping center

Pelos teus círculos
vagamos sem rumo
nós almas penadas
do mundo do consumo.

De elevador ao céu
pela escada ao inferno:
os extremos se tocam
no castigo eterno.

Cada loja é um novo
prego em nossa cruz.
Por mais que compremos
estamos sempre nus.

nós que por teus círculos
vagamos sem perdão
à espera (até quando?)
da Grande Liquidação.

(de Prosas seguidas de odes mínimas, 1992)


Feliz...

...Natal

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

This is Where We Live

Vídeo da editora britânica 4th Estate

sábado, 20 de dezembro de 2008

Concerto Campestre

Leitura obrigatória para os vestibulares da UFRGS e da UFPel, a obra do gaúcho Luiz Antonio de Assis Brasil é, além de uma bela história de amor, uma reflexão sobre a própria condição do gaúcho. A leitura propõe a relação dialética entre a natureza bruta e a violência de um lado, e de outro a sensibilidade, a cultura, a possibilidade de transformação.

Abaixo, temos um breve guia de leitura da obra.



Uma boa dica para os vestibulandos é o filme Concerto Campestre, de Henrique de Freitas Lima. Com locações nas charqueadas de Pelotas, o filme se destaca pela fotografia e pelo figurino, que levam o espectador à atmosfera das estâncias do século XIX. O elenco global, com Leonardo Vieira e Samara Felippo não compromete, e o veterano Antônio Abujamra se esforça para fazer um sotaque gaudério, protagonizando, intencionalmente ou não, algumas cenas cômicas.
Apesar de tudo, o filme é relativamente fiel ao texto de Assis Brasil, cabendo apenas destacar algumas diferenças entre a adaptação cinematográfica e o texto original:

1)No filme, Clara Vitória é filha única, enquanto no livro ela tem dois irmãos: Eugênio (mais velho, administra a charqueada do pai) e Ambrósio (mais moço e confidente de Clara)

2) No filme, o Maestro é representado pelo galã global Leonardo Vieira, que está longe de encarnar a figura do mulato de face marcada pela rubéola, como foiconcebido por Assis Brasil.

3) Como sempre, a Literatura permite uma riqueza maior de detalhes e de subenredos, o que podemos observar no caso do personagem Silvestre Pimentel. No livro, Silvestre, o noivo de Clara, tem um filho 'ilegítimo', que é tratado por ele como "afilhado". É graças à influência de Clara que Silvestre passa a reconhecê-lo como filho. No filme esse episódio não é colocado e o personagem assume o caráter de vilão (tipico de telenovelas) que irá ameaçar a felicidade dos mocinhos com sua sede de vingança. Assim, no final do filme, Silvestre morre tentando perseguir o Maestro, enquanto no livro, o noivo de Clara foge, após ser acusado injustamente de ter engravidado a mocinha.

Ah, não poderia deixar de mencionar os "defeitos especiais". Ao final do filme, a chuva de sangue idealizada pelo autor do livro se converte em um espetáculo digno de holywood (versão cine trash), com uma chuva de Ketchup e um ciclone de desenho animado.

Contudo, o filme não deixa de ser uma boa oportunidade de tomar contato com a obra.

Mas não há nada que substitua uma boa leitura.



DEIXE AQUI SEU COMENTÁRIO SOBRE O LIVRO, SOBRE O FILME OU SOBRE AMBOS!

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Capitu



Não poderíamos deixar de comentar neste espaço a adaptação global de Dom Casmurro, obra fundamental da prosa machadiana. Na modesta opinião deste professor que vos posta, foi uma grata surpresa. Não quanto aos aspectos técnicos, pois a forma e o visual sempre têm sido privilegiados nas produções de nossa teledramaturgia, mas quanto ao conteúdo.
O elenco, apesar de contar com Maria Fernanda Cândido, reforçou a atmosfera teatral objetivada pela direção. O contraste entre as figuras de Capitu e Bentinho, corroboram a idéia expressa no texto machadiano: "ela era mais mulher do que ele homem".
Outro destaque positivo foi a trilha sonora, com a canção tema "Elephant Gun" do ainda não muito conhecido Beirut. O ecletismo ainda passa por Black Sabbath e Tchaikowsky.
Mas o que realmente surpreendeu foi o fato de a Globo não ter estraçalhado com seu simplismo habitual o grande romance do Machado. Pelo contrário, o risco era enorme, pois a ambigüidade é essência desafiadora do texto machadiano. A trama foi conduzida pela narração de Bentinho (interpretado brilhantemente pelo versátil Michel Melamed) e, claro "envenenando" o leitor/telespectador em relação a Capitu, sem trair o espírito de Dom Casmurro.
Totalmente excelente! Que sirva de estímulo à curiosidade para a (re)leitura desse genial capítulo da literatura brasileira.

Deixe aqui seu comentário e participe da nossa enquete (originalíssima): Capitu traiu Bentinho?

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Vestibular FURG


Meus Caros,

Nossa espera chegou ao fim. Chegou o momento de conquistar a nossa vaga na FURG. Confiança no nosso trabalho, na nossa caminhada, acima de tudo. Estamos juntos nessa!

PS: Acompanhe aqui no blog a resolução e os comentários da prova de Literatura
Se houver uma dúvida de última hora, estamos em contato:

ediralonso@hotmail.com

Um grande abraço,
Sucesso a todos!

domingo, 23 de novembro de 2008

Questões de Revisão: UFPel e FURG

CLIQUE AQUI PARA BAIXAR

*O gabarito estrá disponível até o final da semana.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

Apostila (Volume 7)

Temos aqui:

- Romance de 30
- Geração de 45
- Concretismo
- Literatura Contemporânea
(Conteúdo e exercícios)

CLIQUE AQUI PARA BAIXAR

Meu Jabá

O espaço aqui está aberto também para sugestões musicais. Recomendo a banda gaúcha Stereoplásticos. Tem algo meio Los Hermanos, lembra um pouco Coldplay também.
Ouçam e me digam.

Lonas Bicolores

Um Cavalo No Escuro

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

VESTIBULAR SIMULADO

1- (UFRGS) Assinale a alternativa correta em relação a Marília de Dirceu, de Tomás Antonio Gonzaga.

(A) No livro, é estabelecido um contraste entre a paisagem, bucólica e amena, e o cenário da masmorra, opressivo e triste.
(B) Trata-se de um conjunto de cartas de amor, enviadas por Marília, de Minas Gerais, a Dirceu, que se encontra em Moçambique.
(C) Na obra, o pensamento racional é anulado em favor do sentimentalismo romântico.
(D) Nas liras de Gonzaga, Marília é uma mulher irreal, incorpórea, imaginada pelo pastor Dirceu.
(E) Trata-se de um livro satírico, carregado de termos pejorativos em relação às convenções da época.

2- “Sabeis-lo. Roma é a cidade do fanatismo e da perdição: na alcova do sacerdote dorme a gosto a amásia, no leito da vendida se pendura o Crucifico lívido. É um requintar de gozo blasfemo que mescla o sacrilégio à convulsão do amor, o beijo lascivo à embriaguez da crença!” (início da narrativa II – Solfieri de Noite na taverna).

A partir do trecho citado, é possível afirmar:
I. Há uma espécie de paradoxo nas relações enunciadas: sacerdote/amante, prostituta/crente, sacrilégio/amor, beijo lascivo/fé. Esse paradoxo conduz o leitor a uma visão “amarga” de valores e
práticas sociais postos em vigor, mas não requeridos pela sociedade dos que os vivem.
II. As relações enunciadas não são paradoxais, uma vez que remetem o leitor às experiências comportamentais dos que habitam o mundo de Noite na taverna, que se pode interpretar como uma obra que representa a sociedade burguesa de 1900, em cujas estruturas morais se percebia um retorno à Roma pagã, conhecida pela “falta de moral”.
III. Configura-se apenas como brincadeira de um adolescente, Álvares de Azevedo, jovem poeta morto aos 21 anos de idade em conseqüência de seu “estilo de vida” bem representado nas narrativas de Noite na taverna: boêmio, descrente do mundo, próximo de rituais satânicos, experimentador da prostituição, do assassínio, da pedofilia e de outros comportamentos que contou em seus textos.

Marque a alternativa correta:
a) As proposições I e II estão corretas
b) Apenas a proposição II está correta
c) Apenas a proposição III está correta
d) Apenas a proposição I está correta
e) As proposições I e III estão corretas

3- Assinale a afirmativa incorreta quanto a traços do Romantismo presentes no poema Navio Negreiro, de Castro Alves.

a) Contraste entre o real e o ideal.
b) Tendência ao passional.
c) Evasão em relação à realidade social.
d) Referência à natureza.
e) Propensão à melancolia.

4- Sobre o conto "A Carteira" podemos afirmar:
a) Contrariando a estética romântica, aborda o triunfo da moral sobre os impulsos do indivíduo, o que se desdobra na aceitação dos valores da sociedade.
b) Tem como tema central o triângulo amoroso, ensejando um trágico desfecho com a morte de Gustavo.
c) Constitui uma análise crítica acerca da degradação moral da sociedade capitalista, ao identificar a honestidade com o fracasso.
d) É narrado em primeira pessoa por Honório, o que permite ao leitor reconstituir, à maneira realista, o seu drama de consciência.
e) Amélia é o estereótipo da mulher machadiana: incondicionalmente fiel, ainda que por força da hipocrisia das instituições, e submissa ao marido.

5- (UFPel 2007 Inverno) Lê o trecho a seguir de uma das obras indicadas para este vestibular.
Eram cinco horas da manhã e o cortiço acordava, abrindo, não os olhos, mas a sua infinidade de portas e janelas alinhadas. Um acordar alegre e farto de quem dormiu de uma assentada, sete horas de chumbo.
[...]
O rumor crescia, condensando-se; o zunzum de todos os dias acentuava-se; já se não destacavam vozes dispersas, mas um só ruído compacto que enchia todo o cortiço. Começavam a fazer compras na venda; ensarilhavam-se discussões e rezingas; ouviam-se gargalhadas e pragas; já se não falava, gritava-se. Sentia-se naquela fermentação sangüínea, naquela gula viçosa de plantas rasteiras que mergulham os pés vigorosos na lama preta e nutriente da vida, o prazer animal de existir, a triunfante satisfação de respirar sobre a terra.

Assinala a alternativa que NÃO corresponda a uma coerente leitura da obra representada pelo fragmento acima.
(a) No texto, o narrador enfatiza a força do coletivo. Todo o cortiço é apresentado como um personagem que, aos poucos, acorda tal qual uma colméia humana.
(b) O texto apresenta um dinamismo descritivo, ao enfatizar os elementos visuais, olfativos e auditivos.
(c) Através da descrição do despertar do cortiço, o narrador apresenta os elementos introspectivos dos personagens, procurando criar correspondências entre o mundo físico e o metafísico.
(d) O discurso naturalista do autor enfatiza nos personagens o aspecto animalesco, “rasteiro” do ser humano, mas também a sua vitalidade e energia naturais, oriundas do prazer de existir.
(e) Observa-se, no discurso do narrador, a constante utilização de metáforas, dentre outros recursos, para enriquecer a apresentação de elementos descritivos que comprovem a sua tese determinista.
(f) I.R.

6- Considere as afirmações que seguem.
I - Triste Fim de Policarpo Quaresma relata a vida de um modesto funcionário público em três diferentes fases, que se relacionam, de certa forma, às três partes em que se dividem tal romance.
II - A primeira etapa da obra e da vida de Policarpo retrata o cotidiano simples e suburbano desse funcionário público ufanista e sonhador, que pretende instaurar no país uma reforma cultural.
III - A segunda parte, refere-se a Quaresma, que, ao sair do hospício, torna-se proprietário rural. Defrontando-se com a rotina e a política do campo, busca reformular o país tendo como a agricultura.
IV - O estágio final do romance, apresenta-nos o protagonista como soldado voluntário na Revolta da Armada, de 1893, revelando o clima político da República Velha. Aqui, o personagem principal prepara uma reforma política para a Pátria.

Sobre a obra Triste Fim de Policarpo Quaresma são corretas?
a) II, II e III.
b) I e II.
c) II, III e IV.
d) I, II, III e IV.
e) III e IV .

7- (FURG 2007) Com o conto Negrinho do Pastoreio, Simões Lopes Neto

a) leva o leitor a perceber que a literatura de massa, como manifestação cultural do povo, é superior à literatura erudita.
b) denuncia, através de uma manifestação de domínio popular, as formas bárbaras com que os negros rebeldes eram tratados, quando fugiam das fazendas.
c) elimina traços que tipificam a maldade da escravidão. Acentuando o perfil de bondade e de abnegação do Negrinho.
d) faz da perda de um animal uma metáfora da religiosidade, quando o Negrinho vê a aparição de Nossa Senhora trazendo-lhe de volta o cavalo perdido.
e) apropria-se de uma lenda e a estiliza na geografia sul-rio-grandense, como forma de adaptar uma manifestação folclórica, de domínio popular.

8- Assinale a alternativa correta para as características do Modernismo de 1922, também chamado de “fase heróica”.

a) espírito polêmico e destruidor, valorização poética do cotidiano, nacionalismo, busca da originalidade a qualquer preço.
b) Temática ampla com preocupação filosófica, predomínio do romance regionalista, valorização do cotidiano, nacionalismo.
c) Espírito polêmico, busca da originalidade, predomínio do romance psicológico, valorização da cidade e das máquinas.
d) Visão futurista, espírito polêmico e destruidor, predomínio da prosa poética, valorização da cidade e das máquinas.
e) Valorização poética do cotidiano, linguagem repleta de neologismos, nacionalismo e busca da poesia na natureza.

Gabarito:
1-A / 2-D / 3-C / 4-C / 5-C / 6-D / 7-E / 8-A

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Simulado Albert Einstein

Caros alunos,

As questões do nosso pré-simulado estarão disponíveis aqui na sexta-feira. Vamos privilegiar aquelas obras literárias que estudamos no ano passado, para que vocês possam resgatar esses conteúdos.

Se quiserem adiantar o estudo, dêem uma olhada em:

1. Marília de Dirceu (Tomás Antônio Gonzaga)
2. Noite na Taverna (Álvares de Azevedo)
3. Navio Negreiro (Castro Alves)
4. Uns Braços / A Carteira (Machado de Assis)
5. O Cortiço (Aluísio Azevedo)
6. Lendas do Sul (Simões Lopes Neto)
7. Triste Fim de Policarpo Quaresma (Lima Barreto)

Um Abraço!

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Teatro Contemporâneo


Aqui vão os resumos de duas peças essenciais para os vestibulares da UFRGS e da UFCSPA:

- Vestido de Noiva (Nelson Rodrigues)
- O Auto da Compadecida (Ariano Suassuna)

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Dois Irmãos: Guia de Leitura




CLIQUE AQUI PARA BAIXAR

Leituras para os alunos do Albert Einstein

Pessoal,

Segue aqui a lista de contos para as nossas avaliações na próxima semana:

1º Ano

- A Carteira (Machado de Assis)
- Uns Braços (Machado de Assis)
- Missa do Galo(Machado de Assis)
- No Retiro da Figueira (Moacyr Scliar)

2º Ano

- A Carteira (Machado de Assis)
- Uns Braços (Machado de Assis)

3º Ano

- A Terceira Margem do Rio (Guimarães Rosa)
- Natal na Barca (Lygia F. Telles)
- Crachá nos dentes (Lygia F. Telles)
- A Caçada (Lygia F. Telles)

*Os alunos do 3º ano devem estudar, além dos contos, os autores apresentados ao longo do bimestre.

Um Abraço!

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Contos de Machado de Assis

Segue aqui a lista de contos para as provas trimestrais do Colégio João Paulo I.

- A Cartomante
- O Alienista
- Um Homem Célebre
- Missa do Galo
- O Espelho

Boas leituras a todos.

segunda-feira, 21 de julho de 2008

Baixe as Leituras Obrigatórias da UFPel!!!


Atualizamos os links para download dos livros exigidos no vestibular da UFPel. CONFIRA NA LATERAL DO BLOG.

domingo, 20 de julho de 2008

Acertamos: Terceira margem na prova!


Logo que foram divulgadas as novas leituras já surgiram alguns indícios... A terceira margem do rio e Natal na Barca já fizeram parte de programas de prova anteriores na UFPel, e o retorno desses contos à lista obrigatória demonstra as preferências da banca. Nesse sentido, antecipamos em nossas aulas a abordagem do conto de Guimarães Rosa, e, na sexta feira, colocamos o texto em destaque aqui no blog.

É isso aí gurizada! A prova estava para nós!!!

sexta-feira, 18 de julho de 2008

Vestibular de Inverno UFPel

Boa prova a todos!!!

A Terceira Margem do Rio



(Guimarães Rosa)


Nosso pai era homem cumpridor, ordeiro, positivo; e sido assim desde mocinho e menino, pelo que testemunharam as diversas sensatas pessoas, quando indaguei a informação. Do que eu mesmo me alembro, ele não figurava mais estúrdio nem mais triste do que os outros, conhecidos nossos. Só quieto. Nossa mãe era quem regia, e que ralhava no diário com a gente — minha irmã, meu irmão e eu. Mas se deu que, certo dia, nosso pai mandou fazer para si uma canoa.

Era a sério. Encomendou a canoa especial, de pau de vinhático, pequena, mal com a tabuinha da popa, como para caber justo o remador. Mas teve de ser toda fabricada, escolhida forte e arqueada em rijo, própria para dever durar na água por uns vinte ou trinta anos. Nossa mãe jurou muito contra a idéia. Seria que, ele, que nessas artes não vadiava, se ia propor agora para pescarias e caçadas? Nosso pai nada não dizia. Nossa casa, no tempo, ainda era mais próxima do rio, obra de nem quarto de légua: o rio por aí se estendendo grande, fundo, calado que sempre. Largo, de não se poder ver a forma da outra beira. E esquecer não posso, do dia em que a canoa ficou pronta.

Sem alegria nem cuidado, nosso pai encalcou o chapéu e decidiu um adeus para a gente. Nem falou outras palavras, não pegou matula e trouxa, não fez a alguma recomendação. Nossa mãe, a gente achou que ela ia esbravejar, mas persistiu somente alva de pálida, mascou o beiço e bramou: — "Cê vai, ocê fique, você nunca volte!" Nosso pai suspendeu a resposta. Espiou manso para mim, me acenando de vir também, por uns passos. Temi a ira de nossa mãe, mas obedeci, de vez de jeito. O rumo daquilo me animava, chega que um propósito perguntei: — "Pai, o senhor me leva junto, nessa sua canoa?" Ele só retornou o olhar em mim, e me botou a bênção, com gesto me mandando para trás. Fiz que vim, mas ainda virei, na grota do mato, para saber. Nosso pai entrou na canoa e desamarrou, pelo remar. E a canoa saiu se indo — a sombra dela por igual, feito um jacaré, comprida longa.

Nosso pai não voltou. Ele não tinha ido a nenhuma parte. Só executava a invenção de se permanecer naqueles espaços do rio, de meio a meio, sempre dentro da canoa, para dela não saltar, nunca mais. A estranheza dessa verdade deu para. estarrecer de todo a gente. Aquilo que não havia, acontecia. Os parentes, vizinhos e conhecidos nossos, se reuniram, tomaram juntamente conselho.

Nossa mãe, vergonhosa, se portou com muita cordura; por isso, todos pensaram de nosso pai a razão em que não queriam falar: doideira. Só uns achavam o entanto de poder também ser pagamento de promessa; ou que, nosso pai, quem sabe, por escrúpulo de estar com alguma feia doença, que seja, a lepra, se desertava para outra sina de existir, perto e longe de sua família dele. As vozes das notícias se dando pelas certas pessoas — passadores, moradores das beiras, até do afastado da outra banda — descrevendo que nosso pai nunca se surgia a tomar terra, em ponto nem canto, de dia nem de noite, da forma como cursava no rio, solto solitariamente. Então, pois, nossa mãe e os aparentados nossos, assentaram: que o mantimento que tivesse, ocultado na canoa, se gastava; e, ele, ou desembarcava e viajava s'embora, para jamais, o que ao menos se condizia mais correto, ou se arrependia, por uma vez, para casa.

No que num engano. Eu mesmo cumpria de trazer para ele, cada dia, um tanto de comida furtada: a idéia que senti, logo na primeira noite, quando o pessoal nosso experimentou de acender fogueiras em beirada do rio, enquanto que, no alumiado delas, se rezava e se chamava. Depois, no seguinte, apareci, com rapadura, broa de pão, cacho de bananas. Enxerguei nosso pai, no enfim de uma hora, tão custosa para sobrevir: só assim, ele no ao-longe, sentado no fundo da canoa, suspendida no liso do rio. Me viu, não remou para cá, não fez sinal. Mostrei o de comer, depositei num oco de pedra do barranco, a salvo de bicho mexer e a seco de chuva e orvalho. Isso, que fiz, e refiz, sempre, tempos a fora. Surpresa que mais tarde tive: que nossa mãe sabia desse meu encargo, só se encobrindo de não saber; ela mesma deixava, facilitado, sobra de coisas, para o meu conseguir. Nossa mãe muito não se demonstrava.

Mandou vir o tio nosso, irmão dela, para auxiliar na fazenda e nos negócios. Mandou vir o mestre, para nós, os meninos. Incumbiu ao padre que um dia se revestisse, em praia de margem, para esconjurar e clamar a nosso pai o 'dever de desistir da tristonha teima. De outra, por arranjo dela, para medo, vieram os dois soldados. Tudo o que não valeu de nada. Nosso pai passava ao largo, avistado ou diluso, cruzando na canoa, sem deixar ninguém se chegar à pega ou à fala. Mesmo quando foi, não faz muito, dos homens do jornal, que trouxeram a lancha e tencionavam tirar retrato dele, não venceram: nosso pai se desaparecia para a outra banda, aproava a canoa no brejão, de léguas, que há, por entre juncos e mato, e só ele conhecesse, a palmos, a escuridão, daquele.

A gente teve de se acostumar com aquilo. Às penas, que, com aquilo, a gente mesmo nunca se acostumou, em si, na verdade. Tiro por mim, que, no que queria, e no que não queria, só com nosso pai me achava: assunto que jogava para trás meus pensamentos. O severo que era, de não se entender, de maneira nenhuma, como ele agüentava. De dia e de noite, com sol ou aguaceiros, calor, sereno, e nas friagens terríveis de meio-do-ano, sem arrumo, só com o chapéu velho na cabeça, por todas as semanas, e meses, e os anos — sem fazer conta do se-ir do viver. Não pojava em nenhuma das duas beiras, nem nas ilhas e croas do rio, não pisou mais em chão nem capim. Por certo, ao menos, que, para dormir seu tanto, ele fizesse amarração da canoa, em alguma ponta-de-ilha, no esconso. Mas não armava um foguinho em praia, nem dispunha de sua luz feita, nunca mais riscou um fósforo. O que consumia de comer, era só um quase; mesmo do que a gente depositava, no entre as raízes da gameleira, ou na lapinha de pedra do barranco, ele recolhia pouco, nem o bastável. Não adoecia? E a constante força dos braços, para ter tento na canoa, resistido, mesmo na demasia das enchentes, no subimento, aí quando no lanço da correnteza enorme do rio tudo rola o perigoso, aqueles corpos de bichos mortos e paus-de-árvore descendo — de espanto de esbarro. E nunca falou mais palavra, com pessoa alguma. Nós, também, não falávamos mais nele. Só se pensava. Não, de nosso pai não se podia ter esquecimento; e, se, por um pouco, a gente fazia que esquecia, era só para se despertar de novo, de repente, com a memória, no passo de outros sobressaltos.

Minha irmã se casou; nossa mãe não quis festa. A gente imaginava nele, quando se comia uma comida mais gostosa; assim como, no gasalhado da noite, no desamparo dessas noites de muita chuva, fria, forte, nosso pai só com a mão e uma cabaça para ir esvaziando a canoa da água do temporal. Às vezes, algum conhecido nosso achava que eu ia ficando mais parecido com nosso pai. Mas eu sabia que ele agora virara cabeludo, barbudo, de unhas grandes, mal e magro, ficado preto de sol e dos pêlos, com o aspecto de bicho, conforme quase nu, mesmo dispondo das peças de roupas que a gente de tempos em tempos fornecia.

Nem queria saber de nós; não tinha afeto? Mas, por afeto mesmo, de respeito, sempre que às vezes me louvavam, por causa de algum meu bom procedimento, eu falava: — "Foi pai que um dia me ensinou a fazer assim..."; o que não era o certo, exato; mas, que era mentira por verdade. Sendo que, se ele não se lembrava mais, nem queria saber da gente, por que, então, não subia ou descia o rio, para outras paragens, longe, no não-encontrável? Só ele soubesse. Mas minha irmã teve menino, ela mesma entestou que queria mostrar para ele o neto. Viemos, todos, no barranco, foi num dia bonito, minha irmã de vestido branco, que tinha sido o do casamento, ela erguia nos braços a criancinha, o marido dela segurou, para defender os dois, o guarda-sol. A gente chamou, esperou. Nosso pai não apareceu. Minha irmã chorou, nós todos aí choramos, abraçados.

Minha irmã se mudou, com o marido, para longe daqui. Meu irmão resolveu e se foi, para uma cidade. Os tempos mudavam, no devagar depressa dos tempos. Nossa mãe terminou indo também, de uma vez, residir com minha irmã, ela estava envelhecida. Eu fiquei aqui, de resto. Eu nunca podia querer me casar. Eu permaneci, com as bagagens da vida. Nosso pai carecia de mim, eu sei — na vagação, no rio no ermo — sem dar razão de seu feito. Seja que, quando eu quis mesmo saber, e firme indaguei, me diz-que-disseram: que constava que nosso pai, alguma vez, tivesse revelado a explicação, ao homem que para ele aprontara a canoa. Mas, agora, esse homem já tinha morrido, ninguém soubesse, fizesse recordação, de nada mais. Só as falsas conversas, sem senso, como por ocasião, no começo, na vinda das primeiras cheias do rio, com chuvas que não estiavam, todos temeram o fim-do-mundo, diziam: que nosso pai fosse o avisado que nem Noé, que, por tanto, a canoa ele tinha antecipado; pois agora me entrelembro. Meu pai, eu não podia malsinar. E apontavam já em mim uns primeiros cabelos brancos.

Sou homem de tristes palavras. De que era que eu tinha tanta, tanta culpa? Se o meu pai, sempre fazendo ausência: e o rio-rio-rio, o rio — pondo perpétuo. Eu sofria já o começo de velhice — esta vida era só o demoramento. Eu mesmo tinha achaques, ânsias, cá de baixo, cansaços, perrenguice de reumatismo. E ele? Por quê? Devia de padecer demais. De tão idoso, não ia, mais dia menos dia, fraquejar do vigor, deixar que a canoa emborcasse, ou que bubuiasse sem pulso, na levada do rio, para se despenhar horas abaixo, em tororoma e no tombo da cachoeira, brava, com o fervimento e morte. Apertava o coração. Ele estava lá, sem a minha tranqüilidade. Sou o culpado do que nem sei, de dor em aberto, no meu foro. Soubesse — se as coisas fossem outras. E fui tomando idéia.

Sem fazer véspera. Sou doido? Não. Na nossa casa, a palavra doido não se falava, nunca mais se falou, os anos todos, não se condenava ninguém de doido. Ninguém é doido. Ou, então, todos. Só fiz, que fui lá. Com um lenço, para o aceno ser mais. Eu estava muito no meu sentido. Esperei. Ao por fim, ele apareceu, aí e lá, o vulto. Estava ali, sentado à popa. Estava ali, de grito. Chamei, umas quantas vezes. E falei, o que me urgia, jurado e declarado, tive que reforçar a voz: — "Pai, o senhor está velho, já fez o seu tanto... Agora, o senhor vem, não carece mais... O senhor vem, e eu, agora mesmo, quando que seja, a ambas vontades, eu tomo o seu lugar, do senhor, na canoa!..." E, assim dizendo, meu coração bateu no compasso do mais certo.

Ele me escutou. Ficou em pé. Manejou remo n'água, proava para cá, concordado. E eu tremi, profundo, de repente: porque, antes, ele tinha levantado o braço e feito um saudar de gesto — o primeiro, depois de tamanhos anos decorridos! E eu não podia... Por pavor, arrepiados os cabelos, corri, fugi, me tirei de lá, num procedimento desatinado. Porquanto que ele me pareceu vir: da parte de além. E estou pedindo, pedindo, pedindo um perdão.

Sofri o grave frio dos medos, adoeci. Sei que ninguém soube mais dele. Sou homem, depois desse falimento? Sou o que não foi, o que vai ficar calado. Sei que agora é tarde, e temo abreviar com a vida, nos rasos do mundo. Mas, então, ao menos, que, no artigo da morte, peguem em mim, e me depositem também numa canoinha de nada, nessa água que não pára, de longas beiras: e, eu, rio abaixo, rio a fora, rio a dentro — o rio.


Texto extraído do livro "Primeiras Estórias", Editora Nova Fronteira - Rio de Janeiro, 1988, pág. 32, cuja compra e leitura recomendamos.

Natal na Barca

Lygia Fagundes Telles


Não quero nem devo lembrar aqui por que me encontrava naquela barca. Só sei que em redor tudo era silêncio e treva. E que me sentia bem naquela solidão. Na embarcação desconfortável, tosca, apenas quatro passageiros. Uma lanterna nos iluminava com sua luz vacilante: um velho, uma mulher com uma criança e eu.

O velho, um bêbado esfarrapado, deitara-se de comprido no banco, dirigira palavras amenas a um vizinho invisível e agora dormia. A mulher estava sentada entre nós, apertando nos braços a criança enrolada em panos. Era uma mulher jovem e pálida. O longo manto escuro que lhe cobria a cabeça dava-lhe o aspecto de uma figura antiga.

Pensei em falar-lhe assim que entrei na barca. Mas já devíamos estar quase no fim da viagem e até aquele instante não me ocorrera dizer-lhe qualquer palavra. Nem combinava mesmo com uma barca tão despojada, tão sem artifícios, a ociosidade de um diálogo. Estávamos sós. E o melhor ainda era não fazer nada, não dizer nada, apenas olhar o sulco negro que a embarcação ia fazendo no rio.

Debrucei-me na grade de madeira carcomida. Acendi um cigarro. Ali estávamos os quatro, silenciosos como mortos num antigo barco de mortos deslizando na escuridão. Contudo, estávamos vivos. E era Natal.

A caixa de fósforos escapou-me das mãos e quase resvalou para o. rio. Agachei-me para apanhá-la. Sentindo então alguns respingos no rosto, inclinei-me mais até mergulhar as pontas dos dedos na água.

— Tão gelada — estranhei, enxugando a mão.

— Mas de manhã é quente.

Voltei-me para a mulher que embalava a criança e me observava com um meio sorriso. Sentei-me no banco ao seu lado. Tinha belos olhos claros, extraordinariamente brilhantes. Reparei que suas roupas (pobres roupas puídas) tinham muito caráter, revestidas de uma certa dignidade.

— De manhã esse rio é quente — insistiu ela, me encarando.

— Quente?

— Quente e verde, tão verde que a primeira vez que lavei nele uma peça de roupa pensei que a roupa fosse sair esverdeada. É a primeira vez que vem por estas bandas?

Desviei o olhar para o chão de largas tábuas gastas. E respondi com uma outra pergunta:

— Mas a senhora mora aqui perto?

— Em Lucena. Já tomei esta barca não sei quantas vezes, mas não esperava que justamente hoje...

A criança agitou-se, choramingando. A mulher apertou-a mais contra o peito. Cobriu-lhe a cabeça com o xale e pôs-se a niná-la com um brando movimento de cadeira de balanço. Suas mãos destacavam-se exaltadas sobre o xale preto, mas o rosto era sereno.

— Seu filho?

— É. Está doente, vou ao especialista, o farmacêutico de Lucena achou que eu devia ver um médico hoje mesmo. Ainda ontem ele estava bem mas piorou de repente. Uma febre, só febre... Mas Deus não vai me abandonar.

— É o caçula?

Levantou a cabeça com energia. O queixo agudo era altivo mas o olhar tinha a expressão doce.

— É o único. O meu primeiro morreu o ano passado. Subiu no muro, estava brincando de mágico quando de repente avisou, vou voar! E atirou-se. A queda não foi grande, o muro não era alto, mas caiu de tal jeito... Tinha pouco mais de quatro anos.

Joguei o cigarro na direção do rio e o toco bateu na grade, voltou e veio rolando aceso pelo chão. Alcancei-o com a ponta do sapato e fiquei a esfregá-lo devagar. Era preciso desviar o assunto para aquele filho que estava ali, doente, embora. Mas vivo.

— E esse? Que idade tem?

— Vai completar um ano. — E, noutro tom, inclinando a cabeça para o ombro: — Era um menino tão alegre. Tinha verdadeira mania com mágicas. Claro que não saía nada, mas era muito engraçado... A última mágica que fez foi perfeita, vou voar! disse abrindo os braços. E voou.

Levantei-me. Eu queria ficar só naquela noite, sem lembranças, sem piedade. Mas os laços (os tais laços humanos) já ameaçavam me envolver. Conseguira evitá-los até aquele instante. E agora não tinha forças para rompê-los.

— Seu marido está à sua espera?

— Meu marido me abandonou.

Sentei-me e tive vontade de rir. Incrível. Fora uma loucura fazer a primeira pergunta porque agora não podia mais parar, ah! aquele sistema dos vasos comunicantes.

— Há muito tempo? Que seu marido...

— Faz uns seis meses. Vivíamos tão bem, mas tão bem. Foi quando ele encontrou por acaso essa antiga namorada, me falou nela fazendo uma brincadeira, a Bila enfeiou, sabe que de nós dois fui eu que acabei ficando mais bonito? Não tocou mais no assunto. Uma manhã ele se levantou como todas as manhãs, tomou café, leu o jornal, brincou com o menino e foi trabalhar. Antes de sair ainda fez assim com a mão, eu estava na cozinha lavando a louça e ele me deu um adeus através da tela de arame da porta, me lembro até que eu quis abrir a porta, não gosto de ver ninguém falar comigo com aquela tela no meio... Mas eu estava com a mão molhada. Recebi a carta de tardinha, ele mandou uma carta. Fui morar com minha mãe numa casa que alugamos perto da minha escolinha. Sou professora.

Olhei as nuvens tumultuadas que corriam na mesma direção do rio. Incrível. Ia contando as sucessivas desgraças com tamanha calma, num tom de quem relata fatos sem ter realmente participado deles. Como se não bastasse a pobreza que espiava pelos remendos da sua roupa, perdera o filhinho, o marido, via pairar uma sombra sobre o segundo filho que ninava nos braços. E ali estava sem a menor revolta, confiante. Apatia? Não, não podiam ser de uma apática aqueles olhos vivíssimos, aquelas mãos enérgicas. Inconsciência? Uma certa irritação me fez andar.

— A senhora é conformada.

— Tenho fé, dona. Deus nunca me abandonou.

— Deus — repeti vagamente.

— A senhora não acredita em Deus?

— Acredito — murmurei. E ao ouvir o som débil da minha afirmativa, sem saber por quê, perturbei-me. Agora entendia. Aí estava o segredo daquela segurança, daquela calma. Era a tal fé que removia montanhas...

Ela mudou a posição da criança, passando-a do ombro direito para o esquerdo. E começou com voz quente de paixão:

— Foi logo depois da morte do meu menino. Acordei uma noite tão desesperada que saí pela rua afora, enfiei um casaco e saí descalça e chorando feito louca, chamando por ele! Sentei num banco do jardim onde toda tarde ele ia brincar. E fiquei pedindo, pedindo com tamanha força, que ele, que gostava tanto de mágica, fizesse essa mágica de me aparecer só mais uma vez, não precisava ficar, se mostrasse só um instante, ao menos mais uma vez, só mais uma! Quando fiquei sem lágrimas, encostei a cabeça no banco e não sei como dormi. Então sonhei e no sonho Deus me apareceu, quer dizer, senti que ele pegava na minha mão com sua mão de luz. E vi o meu menino brincando com o Menino Jesus no jardim do Paraíso. Assim que ele me viu, parou de brincar e veio rindo ao meu encontro e me beijou tanto, tanto... Era tamanha sua alegria que acordei rindo também, com o sol batendo em mim.

Fiquei sem saber o que dizer. Esbocei um gesto e em seguida, apenas para fazer alguma coisa, levantei a ponta do xale que cobria a cabeça da criança. Deixei cair o xale novamente e voltei-me para o rio. O menino estava morto. Entrelacei as mãos para dominar o tremor que me sacudiu. Estava morto. A mãe continuava a niná-lo, apertando-o contra o peito. Mas ele estava morto.

Debrucei-me na grade da barca e respirei penosamente: era como se estivesse mergulhada até o pescoço naquela água. Senti que a mulher se agitou atrás de mim

— Estamos chegando — anunciou.

Apanhei depressa minha pasta. O importante agora era sair, fugir antes que ela descobrisse, correr para longe daquele horror. Diminuindo a marcha, a barca fazia uma larga curva antes de atracar. O bilheteiro apareceu e pôs-se a sacudir o velho que dormia:

- Chegamos!... Ei! chegamos!

Aproximei-me evitando encará-la.

— Acho melhor nos despedirmos aqui — disse atropeladamente, estendendo a mão.

Ela pareceu não notar meu gesto. Levantou-se e fez um movimento como se fosse apanhar a sacola. Ajudei-a, mas ao invés de apanhar a sacola que lhe estendi, antes mesmo que eu pudesse impedi-lo, afastou o xale que cobria a cabeça do filho.

— Acordou o dorminhoco! E olha aí, deve estar agora sem nenhuma febre.

— Acordou?!

Ela sorriu:

— Veja...

Inclinei-me. A criança abrira os olhos — aqueles olhos que eu vira cerrados tão definitivamente. E bocejava, esfregando a mãozinha na face corada. Fiquei olhando sem conseguir falar.

— Então, bom Natal! — disse ela, enfiando a sacola no braço.

Sob o manto preto, de pontas cruzadas e atiradas para trás, seu rosto resplandecia. Apertei-lhe a mão vigorosa e acompanhei-a com o olhar até que ela desapareceu na noite.

Conduzido pelo bilheteiro, o velho passou por mim retomando seu afetuoso diálogo com o vizinho invisível. Saí por último da barca. Duas vezes voltei-me ainda para ver o rio. E pude imaginá-lo como seria de manhã cedo: verde e quente. Verde e quente.


Texto extraído do livro “Para gostar de ler – Volume 9 – Contos”, Editora Ática – São Paulo, 1984, pág. 67.

domingo, 15 de junho de 2008

Nalgum Lugar

(E.E.cummings)

nalgum lugar em que eu nunca estive,alegremente além
de qualquer experiência,teus olhos têm o seu silêncio:
no teu gesto mais frágil há coisas que me encerram,
ou que eu não ouso tocar porque estão demasiado perto

teu mais ligeiro olhar facilmente me descerra
embora eu tenha me fechado como dedos,nalgum lugar
me abres sempre pétala por pétala como a Primavera abre
(tocando sutilmente,misteriosamente)a sua primeira rosa

ou se quiseres me ver fechado,eu e
minha vida nos fecharemos belamente,de repente,
assim como o coração desta flor imagina
a neve cuidadosamente descendo em toda a parte;

nada que eu possa perceber neste universo iguala
o poder de tua imensa fragilidade:cuja textura
compele-me com a cor de seus continentes,
restituindo a morte e o sempre cada vez que respira

(não sei dizer o que há em ti que fecha
e abre;só uma parte de mim compreende que a
voz dos teus olhos é mais profunda que todas as rosas)
ninguém, nem mesmo a chuva,tem mãos tão pequenas


( tradução: Augusto de Campos )

sexta-feira, 11 de abril de 2008

segunda-feira, 7 de abril de 2008

A lírica do amor não realizado em Gonçalves Dias

A lírica amorosa de Gonçalves Dias, maior poeta da primeira geração de nosso Romantismo, é marcada pela impossibilidade da realização amorosa. A chamada “lírica do amor interrompido” ecoa os sofrimentos vividos pelo poeta em seu malogrado relacionamento afetivo com Ana Amélia (cuja família recusou seu pedido de casamento). Assim, há quem afirme que Gonçalves Dias teria escrito a maior parte de seus poemas amorosos pensando nessa mulher inatingível – como é o caso do célebre Ainda uma vez, Adeus!
Mesmo nas poesias de caráter indianista pode-se observar a frustração quanto à concretização do amor. É o que percebemos no poema Leito de folhas verdes.

Leito de folhas verdes

Por que tardas, Jatir, que tanto a custo
À voz do meu amor moves teus passos?
Da noite a viração, movendo as folhas,
Já nos cimos do bosque rumoreja.
Eu sob a copa da mangueira altiva
Nosso leito gentil cobri zelosa
Com mimoso tapiz de folhas brandas,
Onde o frouxo luar brinca entre flores.
Do tamarindo a flor abriu-se, há pouco,
Já solta o bogari mais doce aroma!
Como prece de amor, como estas preces,
No silêncio da noite o bosque exala.
Brilha a lua no céu, brilham estrelas,
Correm perfumes no correr da brisa,
A cujo influxo mágico respira-se
Um quebranto de amor, melhor que a vida!
A flor que desabrocha ao romper d'alva
Um só giro do sol, não mais, vegeta:
Eu sou aquela flor que espero ainda
Doce raio do sol que me dê vida.
Sejam vales ou montes, lago ou terra,
Onde quer que tu vás, ou dia ou noite,
Vai seguindo após ti meu pensamento;
Outro amor nunca tive: és meu, sou tua!
Meus olhos outros olhos nunca viram,
Não sentiram meus lábios outros lábios,
Nem outras mãos, Jatir, que não as tuas
A arazóia na cinta me apertaram.
Do tamarindo a flor jaz entreaberta,
Já solta o bogari mais doce aroma
Também meu coração, como estas flores,
Melhor perfume ao pé da noite exala!
Não me escutas, Jatir! nem tardo acodes
À voz do meu amor, que em vão te chama!
Tupã! lá rompe o sol! do leito inútil
A brisa da manhã sacuda as folhas!


No poema em tela, o poeta filia-se à tradição medieval das canções de amigo imprimindo-lhe a cor local.
Na primeira estrofe, o eu-lírico feminino anseia pela volta de seu amado, Jatir, (1º e 2º versos) e questiona o porquê de sua demora. Note-se que aqui, os elementos da natureza corroboram a sensação de angústia da mulher (3º e 4º versos).
Na segunda e terceira estrofes temos o leito de amor, feito sob a copa da mangueira e feito de folhas brandas. Aqui, a natureza traduz toda a doçura do esperado encontro amoroso: mimoso tapiz de folhas brandas; o frouxo luar brinca entre flores; solta o bogari mais doce aroma.
A espera se prolonga e a angústia cresce, como evidencia a metáfora contida nos versos 4º e 5º da 5ª estrofe: Eu sou aquela flor que espero ainda / Doce raio do sol que me dê vida. Ela é a flor que depende dos raios de sol (a presença do amado) para viver.
A 6ª estrofe evidencia a idealização do amor, que vence todos os obstáculos (versos 1 e 2). Da mesma forma é idealizada a figura feminina que devota total fidelidade ao seu homem, conforme observamos na 7ª estrofe.
Na última estrofe temos a desilusão do eu-lírico. Com a chegada da manhã, a esperança e a expectativa dão lugar à decepção e à tristeza, pois Jatir não responde ao seu chamado. Pede então que a brisa da manhã leve consigo as folhas do leito inútil.

Em Leito de folhas verdes temos, portanto uma síntese dos elementos mais caros à tradição romântica: o sentimentalismo, a idealização amorosa, a idealização da figura feminina, a natureza expressiva, o medievalismo e o nacionalismo (de matiz indianista).

sexta-feira, 4 de abril de 2008

segunda-feira, 24 de março de 2008

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sexta-feira, 21 de março de 2008

Prova da UFRGS valoriza o candidato que lê

O título dessa postagem pode parecer uma afirmação óbvia... Mas a verdade é que existem várias formas de seleção, e cada uma delas privilegia um determinado perfil de candidato. Questões dissertativas sempre constituem um espaço privilegiado para avaliar não só o volume de "conhecimento" acumulado pelo candidato, mas a verdadeira capacidade de processar criticamente essas informações. É realmente problemático mensurar as habilidades dos pré-universitários no campo das ciências humanas facultando-lhes apenas uma possibilidade de resposta exata.Nos vestibulares, a prova de Redação é esse instrumento avaliativo que possibilita ao candidato diferenciar-se dos demais, elaborando suas respostas com autonomia. Infelizmente, são poucas as universidades que ainda propõem questões discursivas além da tradicional Redação (a Unicamp é uma referência nacional, e aqui no RS ainda temos a FURG como exemplo).


Bueno, mas que tipo de leitor nossas universidades vêm selecionando? Nossas provas de Literatura, nos tradicionais moldes "objetivos", seguramente são insuficientes para promover uma seleção criteriosa, que leve em conta o fato de o candidato realmente ter tido uma bagagem literária. Seria hipocrisia desconsiderar o fato de que boa parte dos que conseguem uma vaga na universidade o fizeram com desempenhos "razoáveis" em Literatura graças aos resumos que digeriram. Assim, a elite cultural do país se forma lendo "Veja" e "IstoÉ" (leituras que, se feitas de forma incauta, podem trazer danos irreversíveis a qualquer um).

Mas haveria alguma proposta viável para alterar esse quadro? A UFRGS, que realiza o maior processo seletivo do RS, é tomada como referência em todo o Estado. Nesse sentido, é extremamente animadora a perspectiva gerada pelo vestibular 2008:


A proposta de redação da UFRGS foi, na modesta opinião deste professor, a melhor avaliação de Literatura dos últimos concursos vestibulares.


*envie um e-mail para clubedeliteratura@hotmail.com para obter informações sobre a "REDAÇÃO COMENTADA".



segunda-feira, 17 de março de 2008

Entre a ficção e a realidade - Coletânea de textos

"A Diferença Entre a Verdade e a Ficção - A Ficção tem que fazer sentido." (Mark Twain)


...


"A vida é uma simples sombra que passa (...); é uma história contada com som e fúria por um idiota, e sem sentido algum".

(Sakespeare).
...


Continuidade dos Parques

Havia começado a ler o romance uns dias antes. Abandonou-o por negócios urgentes, voltou a abri-lo quando regressava de trem à chácara; deixava interessar-se lentamente pela trama, pelo desenho dos personagens. Essa tarde, depois de escrever uma carta ao caseiro e discutir com o mordomo uma questão de uns arrendamentos, voltou ao livro com a tranqüilidade do gabinete que dava para o parque dos carvalhos. Esticado na poltrona favorita, de costas para a porta que o teria incomodado com uma irritante possibilidade de intrusões, deixou que sua mão esquerda acariciasse uma e outra vez o veludo verde, e começou a ler os últimos capítulos. Sua memória retinha sem esforço os nomes e as imagens dos protagonistas; a ilusão romanesca ganhou-o quase imediatamente. Gozava do prazer quase perverso de ir descolando-se linha a linha daquilo que o rodeava, e de sentir ao mesmo tempo que sua cabeça descansava comodamente no veludo do alto encosto, que os cigarros continuavam ao alcance da mão, que mais além das janelas dançava o ar do entardecer sob os carvalhos. Palavra a palavra, absorvido pela sórdida disjuntiva dos heróis, deixando-se ir até as imagens que se combinavam e adquiriam cor e movimento, foi testemunha do último encontro na cabana da colina.

Antes entrava a mulher, receosa; agora chegava o amante, com a cara machucada pela chicotada de um galho. Admiravelmente ela fazia estalar o sangue com seus beijos, mas ele recusava as carícias, não tinha vindo para repetir as cerimônias de uma paixão secreta, protegida por um mundo de folhas secas e caminhos furtivos. O punhal se amornava contra seu peito e por baixo gritava a liberdade refugiada. Um diálogo desejante corria pelas páginas como riacho de serpentes e sentia-se que tudo estava decidido desde sempre. Até essas carícias que enredavam o corpo do amante como que querendo retê-lo e dissuadi-lo desenhavam abominavelmente a figura de outro corpo que era necessário destruir. Nada havia sido esquecido: álibis, acasos, possíveis erros. A partir dessa hora cada instante tinha seu emprego minuciosamente atribuído. O duplo repasse, sem dó nem piedade, interrompia-se apenas para que uma mão acariciasse uma bochecha. Começava a anoitecer.

Já sem se olharem, atados rigidamente à tarefa que os esperava, separaram-se na porta da cabana. Ela devia continuar pelo caminho que ia ao norte. Do caminho oposto, ele virou um instante para vê-la correr com o cabelo solto. Correu, por sua vez, apoiando-se nas árvores e nas cercas, até distinguir na bruma do crepúsculo a alameda que levava à casa. Os cachorros não deviam latir e não latiram. O mordomo não estaria a essa hora, e não estava. Subiu os três degraus da varanda e entrou. Do sangue galopando nos seus ouvidos chegavam-lhe as palavras da mulher: primeiro uma sala azul, depois um longo corredor, uma escada acarpetada. No alto, duas portas. Ninguém no primeiro quarto, ninguém no segundo. A porta do salão, e depois o punhal na mão, a luz das janelas, o alto encosto de uma poltrona de veludo verde, a cabeça do homem na poltrona lendo um romance.

(Julio Cortázar)

...


A Caçada

A loja de antiguidades tinha o cheiro de uma arca de sacristia com seus anos embolorados e livros comidos de traça. Com as pontas dos dedos, o homem tocou numa pilha de quadros. Uma mariposa levantou vôo e foi chocar-se contra uma imagem de mãos decepadas.



— Bonita imagem — disse ele.
A velha tirou um grampo do coque, e limpou a unha do polegar. Tornou a enfiar o grampo no cabelo.
— É um São Francisco.
Ele então voltou-se lentamente para a tapeçaria que tomava toda a parede no fundo da loja. Aproximou-se mais. A velha aproximou-se também.
— Já vi que o senhor se interessa mesmo é por isso... Pena que esteja nesse estado.
O homem estendeu a mão até a tapeçaria, mas não chegou a tocá-la.
— Parece que hoje está mais nítida...
— Nítida? — repetiu a velha, pondo os óculos.
Deslizou a mão pela superfície puída.
— Nítida, como?
— As cores estão mais vivas. A senhora passou alguma coisa nela?
A velha encarou-o. E baixou o olhar para a imagem de mãos decepadas. O homem estava tão pálido e perplexo quanto a imagem.
— Não passei nada, imagine... Por que o senhor pergunta?
— Notei uma diferença.
— Não, não passei nada, essa tapeçaria não agüenta a mais leve escova, o senhor não vê? Acho que é a poeira que está sustentando o tecido acrescentou, tirando novamente o grampo da cabeça.
Rodou-o entre os dedos com ar pensativo. Teve um muxoxo:
— Foi um desconhecido que trouxe, precisava muito de dinheiro. Eu disse que o pano estava por demais estragado, que era difícil encontrar um comprador, mas ele insistiu tanto... Preguei aí na parede e aí ficou. Mas já faz anos isso. E o tal moço nunca mais me apareceu.
— Extraordinário...
A velha não sabia agora se o homem se referia à tapeçaria ou ao caso que acabara de lhe contar. Encolheu os ombros. Voltou a limpar as unhas com o grampo.
— Eu poderia vendê-la, mas quero ser franca, acho que não vale mesmo a pena. Na hora que se despregar, é capaz de cair em pedaços.
O homem acendeu um cigarro. Sua mão tremia. Em que tempo, meu Deus! em que tempo teria assistido a essa mesma cena. E onde?...Era uma caçada. No primeiro plano, estava o caçador de arco retesado, apontando para uma touceira espessa. Num plano mais profundo, o segundo caçador espreitava por entre as árvores do bosque, mas esta era apenas uma vaga silhueta, cujo rosto se reduzira a um esmaecido contorno. Poderoso, absoluto era o primeiro caçador, a barba violenta como um bolo de serpentes, os músculos tensos, à espera de que a caça levantasse para desferir-lhe a seta.O homem respirava com esforço. Vagou o olhar pela tapeçaria que tinha a cor esverdeada de um céu de tempestade. Envenenando o tom verde-musgo do tecido, destacavam-se manchas de um negro-violáceo e que pareciam escorrer da folhagem, deslizar pelas botas do caçador e espalhar-se no chão como um líquido maligno. A touceira na qual a caça estava escondida também tinha as mesmas manchas e que tanto podiam fazer parte do desenho como ser simples efeito do tempo devorando o pano.
— Parece que hoje tudo está mais próximo — disse o homem em voz baixa.
— É como se... Mas não está diferente?A velha firmou mais o olhar. Tirou os óculos e voltou a pô-los.
— Não vejo diferença nenhuma.— Ontem não se podia ver se ele tinha ou não disparado a seta...
— Que seta? O senhor está vendo alguma seta?
— Aquele pontinho ali no arco... A velha suspirou.
— Mas esse não é um buraco de traça? Olha aí, a parede já está aparecendo, essas traças dão cabo de tudo — lamentou, disfarçando um bocejo. Afastou-se sem ruído, com suas chinelas de lã. Esboçou um gesto distraído:
— Fique aí à vontade, vou fazer meu chá.
O homem deixou cair o cigarro. Amassou-o devagarinho na sola do sapato. Apertou os maxilares numa contração dolorosa. Conhecia esse bosque, esse caçador, esse céu — conhecia tudo tão bem, mas tão bem! Quase sentia nas narinas o perfume dos eucaliptos, quase sentia morder-lhe a pele o frio úmido da madrugada, ah, essa madrugada! Quando? Percorrera aquela mesma vereda aspirara aquele mesmo vapor que baixava denso do céu verde... Ou subia do chão? O caçador de barba encaracolada parecia sorrir perversamente embuçado. Teria sido esse caçador? Ou o companheiro lá adiante, o homem sem cara espiando por entre as árvores? Uma personagem de tapeçaria. Mas qual? Fixou a touceira onde a caça estava escondida. Só folhas, só silêncio e folhas empastadas na sombra. Mas, detrás das folhas, através das manchas pressentia o vulto arquejante da caça. Compadeceu-se daquele ser em pânico, à espera de uma oportunidade para prosseguir fugindo. Tão próxima a morte! O mais leve movimento que fizesse, e a seta... A velha não a distinguira, ninguém poderia percebê-la, reduzida como estava a um pontinho carcomido, mais pálido do que um grão de pó em suspensão no arco.Enxugando o suor das mãos, o homem recuou alguns passos. Vinha-lhe agora uma certa paz, agora que sabia ter feito parte da caçada. Mas essa era uma paz sem vida, impregnada dos mesmos coágulos traiçoeiros da folhagem. Cerrou os olhos. E se tivesse sido o pintor que fez o quadro? Quase todas as antigas tapeçarias eram reproduções de quadros, pois não eram? Pintara o quadro original e por isso podia reproduzir, de olhos fechados, toda a cena nas suas minúcias: o contorno das árvores, o céu sombrio, o caçador de barba esgrouvinhada, só músculos e nervos apontando para a touceira... "Mas se detesto caçadas! Por que tenho que estar aí dentro?" Apertou o lenço contra a boca. A náusea. Ah, se pudesse explicar toda essa familiaridade medonha, se pudesse ao menos... E se fosse um simples espectador casual, desses que olham e passam? Não era uma hipótese? Podia ainda ter visto o quadro no original, a caçada não passava de uma ficção. "Antes do aproveitamento da tapeçaria..." — murmurou, enxugando os vãos dos dedos no lenço.Atirou a cabeça para trás como se o puxassem pelos cabelos, não, não ficara do lado de fora, mas lá dentro, encravado no cenário! E por que tudo parecia mais nítido do que na véspera, por que as cores estavam mais fortes apesar da penumbra? Por que o fascínio que se desprendia da paisagem vinha agora assim vigoroso, rejuvenescido?...

Saiu de cabeça baixa, as mãos cerradas no fundo dos bolsos. Parou meio ofegante na esquina. Sentiu o corpo moído, as pálpebras pesadas. E se fosse dormir? Mas sabia que não poderia dormir, desde já sentia a insônia a segui-lo na mesma marcação da sua sombra. Levantou a gola do paletó. Era real esse frio? Ou a lembrança do frio da tapeçaria? "Que loucura!... E não estou louco", concluiu num sorriso desamparado. Seria uma solução fácil. "Mas não estou louco.".Vagou pelas ruas, entrou num cinema, saiu em seguida e quando deu acordo de si, estava diante da loja de antiguidades, o nariz achatado na vitrina, tentando vislumbrar a tapeçaria lá no fundo.Quando chegou em casa, atirou-se de bruços na cama e ficou de olhos escancarados, fundidos na escuridão. A voz tremida da velha parecia vir de dentro do travesseiro, uma voz sem corpo, metida em chinelas de lã: "Que seta? Não estou vendo nenhuma seta..." Misturando-se à voz, veio vindo o murmurejo das traças em meio de risadinhas. O algodão abafava as risadas que se entrelaçaram numa rede esverdinhada, compacta, apertando-se num tecido com manchas que escorreram até o limite da tarja. Viu-se enredado nos fios e quis fugir, mas a tarja o aprisionou nos seus braços. No fundo, lá no fundo do fosso, podia distinguir as serpentes enleadas num nó verde-negro. Apalpou o queixo. "Sou o caçador?" Mas ao invés da barba encontrou a viscosidade do sangue.Acordou com o próprio grito que se estendeu dentro da madrugada. Enxugou o rosto molhado de suor. Ah, aquele calor e aquele frio! Enrolou-se nos lençóis. E se fosse o artesão que trabalhou na tapeçaria? Podia revê-la, tão nítida, tão próxima que, se estendesse a mão, despertaria a, folhagem. Fechou os punhos. Haveria de destruí-la, não era verdade que além daquele trapo detestável havia alguma coisa mais, tudo não passava de um retângulo de pano sustentado pela poeira. Bastava soprá-la, soprá-la!

Encontrou a velha na porta da loja. Sorriu irônica: — Hoje o senhor madrugou.— A senhora deve estar estranhando, mas...
— Já não estranho mais nada, moço. Pode entrar, pode entrar, o senhor conhece o caminho..."Conheço o caminho" — murmurou, seguindo lívido por entre os móveis. Parou. Dilatou as narinas. E aquele cheiro de folhagem e terra, de onde vinha aquele cheiro? E por que a loja foi ficando embaçada, lá longe? Imensa, real só a tapeçaria a se alastrar sorrateiramente pelo chão, pelo teto, engolindo tudo com suas manchas esverdinhadas. Quis retroceder, agarrou-se a um armário, cambaleou resistindo ainda e estendeu os braços até a coluna. Seus dedos afundaram por entre galhos e resvalaram pelo tronco de uma árvore, não era uma coluna, era uma árvore! Lançou em volta um olhar esgazeado: penetrara na tapeçaria, estava dentro do bosque, os pés pesados de lama, os cabelos empastados de orvalho. Em redor, tudo parado. Estático. No silêncio da madrugada, nem o piar de um pássaro, nem o farfalhar de uma folha. Inclinou-se arquejante. Era o caçador? Ou a caça? Não importava, não importava, sabia apenas que tinha que prosseguir correndo sem parar por entre as árvores, caçando ou sendo caçado. Ou sendo caçado?... Comprimiu as palmas das mãos contra a cara esbraseada, enxugou no punho da camisa o suor que lhe escorria pelo pescoço. Vertia sangue o lábio gretado.Abriu a boca. E lembrou-se. Gritou e mergulhou numa touceira. Ouviu o assobio da seta varando a folhagem, a dor!"Não..." - gemeu, de joelhos. Tentou ainda agarrar-se à tapeçaria. E rolou encolhido, as mãos apertando o coração.

(Lygia Fagundes Telles)
Publicado no livro "Antes do baile verde", José Olympio Editora – Rio de Janeiro, 1979, foi incluído entre "Os cem melhores contos brasileiros do século", seleção de Ítalo Moriconi, Editora Objetiva – Rio de Janeiro, 2000, pág. 265.

...

O Ator
O homem chega em casa, abre a porta e é recebido pela mulher e os dois
filhos, alegremente. Distribui beijos entre todos, pergunta o que há para
jantar e dirige-se para o seu quarto. Vai tomar um banho, trocar de roupa e
preparar-se para algumas horas de sossego na frente da televisão antes de
dormir. Quando está abrindo a porta do seu quarto, ouve uma voz que grita:
- Corta!
O homem olha em volta, atônito. Descobre que sua casa não é uma casa, é
um cenário. Vem alguém e tira o jornal e a pasta das suas mãos. Uma mulher
vem ver se a sua maquilagem está bem e põe um pouco de pó no seu nariz.
Aproxima-se um homem com um script na mão dizendo que ele errou uma
das falas na hora de beijar as crianças.
- O que é isso? - pergunta o homem. - Quem são vocês? O que estão fazendo
dentro da minha casa? Que luzes são essas?
- O que, enlouqueceu? - pergunta o diretor. - Vamos ter que repetir a cena.
Eu sei que você está cansado, mas...
- Estou cansado, sim senhor. Quero tomar meu banho e botar meu pijama.
Saiam da minha casa. Não sei quem são vocês, mas saiam todos! Saiam!
O diretor fica parado de boca aberta. Toda a equipe fica em silêncio, olhando
para o ator. Finalmente o diretor levanta a mão e diz:
- Tudo bem, pessoal. Deve ser estafa. Vamos parar um pouquinho e...
- Estafa coisa nenhuma! Estou na minha casa, com a minha... A minha
família! O que vocês fizeram com ela? Minha mulher! Os meus filhos!
O homem sai correndo entre os fios e os refletores, à procura da família. O
diretor e um assistente tentam segurá-lo. E então ouve-se uma voz que grita:
- Corta!
Aproxima-se outro homem com um script na mão descobre que o cenário, na
verdade, é um cenário. O homem com um script na mão diz:
- Está bom, mas acho que você precisa ser mais convincente.
- Que-quem é você?
- Como, quem sou eu? Eu sou o diretor. Vamos refazer esta cena. Você tem
que transmitir melhor o desespero do personagem. Ele chega em casa e
descobre que sua casa não é uma casa, é um cenário. Descobre que está no
meio de um filme. Não entende nada.
- Eu não entendo...
- Fica desconcertado. Não sabe se enlouqueceu ou não.
- Eu devo estar louco. Isto não pode estar acontecendo. Onde está minha
mulher? Os meus filhos? A minha casa?
- Assim está melhor. Mas espere até começarmos a rodar. Volte para a sua
marca. Atenção, luzes...
- Mas que marca? Eu não sou personagem nenhum. Eu sou eu! Ninguém me
dirige. Eu estou na minha própria casa, dizendo as minhas próprias falas...
- Boa, boa. Você está fugindo um pouco do script, mas está bom.
- Que script? Não tem script nenhum. Eu digo o que quiser. Isto não é um
filme. E mais, se é um filme,
é uma porcaria de filme. Isto é simbolismo,ultrapassado. Essa de que o
mundo é um palco, que tudo foi predeterminado, que não somos mais do que
atores... Porcaria!
- Boa, boa. Está convincente. Mas espere começar a filmar. Atenção...
O homem agarra o diretor pela frente da camisa.
- Você não vai filmar nada! Está ouvindo? Nada! Saia da minha casa.
O diretor tenta livrar-se. Os dois rolam pelo chão. Nisto ouvese uma voz que
grita:
- Corta!

(Luís Fernando Veríssimo)

sexta-feira, 14 de março de 2008

A Carta de Caminha e a carnavalização do Brasil

Pensando sobre a imagem que temos de vários povos do mundo, facilmente elencamos qualidades positivas, como a pontualidade britânica, a inteligência e capacidade de trabalho dos japoneseses, e assim por diante...

E quanto a nós, brasileiros? Muitos se referem à malandragem, ao popular jeitinho brasileiro (e olha que trabalhamos 4 ou 5 meses dos 12 do ano só para pagar impostos). Mas sem dúvida, a tríade samba, mulher e futebol é a nossa auto-imagem campeã. Em suma, não produzimos nada, mas podemos entreter o resto do mundo com nossa "alegria". Mas afinal, onde começa essa história?

Durante séculos, a literatura foi exclusiva na formação de nossa subjetividade, de nosso inconsciente coletivo. Um grande repositório de nossas idéias, inclusive sobre aquilo que nós somos ou julgamos ser. E o primeiro capítulo dessa história é o que alguns chamam de "certidão de nascimento do Brasil".

O Quinhentismo


O Quinhentismo foi vivido no Brasil em meio ao “descobrimento” e aos interesses da exploração de riquezas materiais. Não se pode falar, propriamente, em Literatura Brasileira, uma vez que os textos da época somente atendem ao ponto de vista do colonizador, pois todos os autores (e potenciais leitores) são europeus. Além disso, predominam na época os relatos de viagem, textos informativos, de caráter documental e, portanto, com maior valor histórico do que literário. Mesmo assim, esses textos são chamados de Literatura de Informação.



Carta a El-Rei Dom Manuel sobre o achamento do Brasil

A famosa Carta de Pero Vaz de Caminha, escrita entre 26 de abril de e 1º de maio de 1500, tinha como objetivo informar ao rei de Portugal o descobrimento e relatar-lhe as peculiaridades do novo território. É tida como uma espécie de “certidão de nascimento” do Brasil (expressão que adere ao ponto de vista do colonizador). Na verdade, é o primeiro retrato de nossa terra e, mesmo passados mais de quinhentos anos, ainda é bastante revelador de marcas profundas na formação de nossa identidade enquanto povo.



Aspectos importantes:

Descritivismo

Tudo na Carta é descrito nos mínimos detalhes. Repare como o índio é analisado como mais um elemento integrante da natureza exótica do local:

A feição deles é parda, algo avermelhada; de bons rostos e bons narizes. Em geral, são bem feitos. Andam nus, sem cobertura alguma. Não fazem o menor caso de cobrir ou mostrar suas vergonhas, e nisso são tão inocentes como quando mostram o rosto. Ambos traziam os beiço de baixo furado e metido nele um osso branco, do comprimento de uma mão travessa e da grossura de um fuso de algodão.


Choque cultural e Origens do estigma da sensualidade brasileira

O trecho acima já revela o choque entre os tabus religiosos do europeu e a nudez dos nativos. Na verdade, a atmosfera edênica fascina os portugueses, e esse registro na Carta começa a forjar uma imagem do Brasil associada à liberdade sexual. Observe o excerto abaixo:


Ali andavam entre eles três ou quatro moças, muito novas e muito gentis, com cabelos muito pretos e compridos, caídos pelas espáduas, e suas vergonhas tão altas e tão cerradinhas e tão limpas das cabeleiras que, de as muito bem olharmos, não tínhamos nenhuma vergonha.



Visão paradisíaca, Concepção mercantilista e colonizadora e Ideal salvacionista


Corroborando a idéia de que o Brasil seria o "eldorado", paraíso perdido na América, a natureza exuberante, exótica e inexplorada é vista com fascínio.



A terra por cima é toda chã e muito cheia de grandes arvoredos. De ponta a ponta é tudo praia redonda, muito chã e muito formosa. [...]



Sem dúvida, a serviço da Coroa, Caminha não poderia deixar de registrar a preocupação em encontrar metais preciosos. Não logrando êxito nesse intento num primeiro instante (o surto aurífero só vai ocorrer no século XVIII, em Minas Gerais), o escrivão sugere insistentemente as potencialidades naturais do local e sugere sua colonização:



Nela até agora não pudemos saber que haja ouro, nem prata, nem coisa alguma de metal ou ferro; nem o vimos. Porém, a terra em si é de muito bons ares, assim frios e temperados, como os de Entre-Douro e Minho, porque neste tempo de agora os achávamos como os de lá.
As águas são muitas e infindas. E em tal maneira é graciosa que, querendo aproveitá-la, tudo dará nela, por causa das águas que tem.
Porém, o melhor fruto que dela se pode tirar me parece que será salvar esta gente. E esta deverá ser a principal semente que Vossa Alteza nela deve lançar.



A Herança Literária da Carta


Além desses caracteres que analisamos acima, a literatura informativa emprestou muitos de seus temas e formas para períodos literários posteriores, em especial para o Romantismo (indianismo, fundação da nacionalidade) e para o Modernismo (revisão crítica da identidade nacional).
O poeta modernista Oswald de Andrade realizou apropriações parodísticas da carta, subvertendo seu sentido ao recortar as frases do texto original, dispondo-as de outra maneira.

As Meninas da Gare
Eram três ou quatro moças bem moças e bem gentis
Com cabelos mui pretos pelas espáduas
E suas vergonhas tão altas e tão saradinhas
Que de nós as muito olharmos
Não tínhamos nenhuma vergonha
(OSWALD DE ANDRADE, em Pau-Brasil)
Cena do filme Caramuru, a Invenção do Brasil.
Ali andavam entre eles três ou quatro moças, bem moças e bem gentis, com cabelos muito pretos, compridos pelas espáduas, e suas vergonhas tão altas, tão cerradinhas e tão limpas das cabeleiras que, de as muito bem olharmos, não tínhamos nenhuma vergonha. (CAMINHA)



Confrontando-se os textos de Oswald e Caminha, a sensação inicial é de estranhamento. O poeta modernista teria plagiado a "Carta"? Certamente não. Esse texto de Oswald é muito mais genial do que parece. O texto modernista se apropria de um fragmento da carta, disposto em verso. E... ? Até aqui nada de novo. Mas preste atenção no título: "As meninas da Gare", ou seja, as meninas da estação (de trem). Com a simples colocação desse título, Oswald empurra o texto de Caminha por mais de 400 anos, atualizando e subvertendo seu significado. O viajante, ao desembarcar na estação, encontra nossas mulheres com o corpo à mostra, disponíveis para a exploração. Trata-se de uma metáfora da prostituição do país ao longo dos séculos!


Bueno, a Carta de Caminha é apenas o primeiro capítulo de nossa viagem pela formação cultural do Brasil, mas certamente suas marcas podem ser percebidas até hoje.

Download da Carta de Caminha (texto integral)