segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Conto: Os varredores de rua (Herta Mueller, Prêmio Nobel de Literatura 2009)

Os varredores de rua


A cidade está impregnada de vazio. Um carro atropela meus olhos com suas luzes.

O condutor foge, pois não podem me ver na escuridão.

Os varredores de rua têm trabalho.

Eles varrem as lâmpadas, varrem as ruas para fora da cidade, varrem o morar das casas, varrem-me os pensamentos da cabeça, varrem-me de uma perna para outra, varrem-me os passos do andar.

Os varredores de rua enviam-me suas vassouras, suas magras e saltitantes vassouras. Os sapatos batem fora do meu corpo.

Caminho atrás de mim, caio fora de mim sobre a margem de minhas imaginações.

O parque late ao meu lado. As corujas comem os beijos que ficaram sobre os bancos. As corujas não dão por minha presença. Os cansados e estafados sonhos acocoram-se nos arbustos.

As vassouras varrem-me as costas porque me apoio muito na noite.

Os varredores de rua varrem as estrelas formando uma pilha, varrem-nas sobre suas pás e as esvaziam no canal.

Um varredor de rua chama um outro varredor, este um outro e este novamente um outro.

Agora todos os varredores falam e misturam todas as ruas. Caminho através de seus gritos, através da espuma de seus chamados e quebro e caio na profundidade das significações.

Dou passos grandes. Arranco minhas pernas com o andar.

O caminho foi varrido para longe.

As vassouras caem sobre mim.

Tudo dá voltas sobre si.

A cidade erra sobre o campo, para algum lugar.

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