domingo, 7 de junho de 2009

Poeta de Cabo Verde ganha o prêmio Camões


O poeta Armenio Vieira, de Cabo Verde, ganhou o Prêmio Camões, o mais importante prêmio literário da língua portuguesa, informou nesta quarta-feira a imprensa de Portugal.

Praia, 03 Junho - O “Prémio Camões” 2009 foi atribuir ao poeta cabo-verdiano Arménio Vieira, segundo escreve o Jornal Público de Portugal. O Prémio Camões foi criado em 1988 pelos governos português e brasileiro para distinguir, todos os anos, escritores dos países lusófonos.

"A título pessoal, eu esperava o prémio. Mas por causa de ser Cabo Verde, admiti que fosse ainda um bocado cedo. É pequeno em relação à imensidão do Brasil, que tem centenas de escritores óptimos. E Portugal também. Seria muito difícil Cabo Verde apanhar o prémio", disse, visivelmente emocionado àquele jornal o nosso escritor Arménio Vieira.

O poeta considera que "é uma honra pessoal”, mas também “é uma honra para Cabo Verde”. É histórico, Cabo Verde nunca tinha ganho. Desta vez lembraram-se do nosso pequeno país", acrescentou Arménio Vieira.

Com este prémio, o galardoado espera que, a partir de agora, a sua obra venha a ser estudada em Cabo Verde e no estrangeiro.

Arménio Vieira nasceu na cidade da Praia, Ilha de Santiago, a 24 de Janeiro de 1941. Além de escritor, tem colaborações em publicações como o “Boletim de Cabo Verde”, a revista “Vértice”, de Coimbra, “Raízes”, “Ponto & Vírgula”, “Fragmentos” e “Sopinha de Alfabeto”. Arménio Vieira também foi redactor no jornal “Voz di Povo”.

O Primeiro Ministro, José Maria Neves, profere esta manhã, 4 de Maio, às 11:00 horas, uma declaração à imprensa, na sequência do prémio atribuído ao poeta cabo-verdiano

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Um Pouco da Poesia de Armenio Vieira


LISBOA - 1971

Em verdade Lisboa não estava ali para nos saudar.
Eis-nos enfim transidos e quase perdidos
no meio de guardas e aviões da Portela.

Em verdade éramos o gado mais pobre
d'África trazido àquele lugar
e como folhas varridas pela vassoura do vento
nossos paramentos de presunção e de casta.

E quando mais tarde surpreendemos o espanto
da mulher que vendia maçãs
e queria saber donde... ao que vínhamos
descobrimos o logro a circular no coração do Império.

Porém o desencanto, que desce ao peito
e trepa a montanha,
necessita da levedura que o tempo fornece.

E num caminhão, por entre caixotes e resquícios da véspera,
fomos seguindo nosso destino
naquela manhã friorenta e molhada por chuviscos d'inverno



CANTO FINAL FINAL OU AGONIA DUMA NOITE INFECUNDA
.

Como a flor cortada rente e desfolhada
ou os olhos vazados da criança
e o seu fio de pranto tênue e impotente
assim a noite caminha com os astros todos em vertigem
até que se atinge o ponto da mudez
a pesada mó triturando a sílaba
a garganta com as cordas dilaceradas
e uma lâmina ácida e pontiaguda enterrada ao nível da carótida

Entenda-se isto como noite e o seu transe derradeiro
tanto assim que a flor desfeita
não embala o coração do poeta
oh não
porque a flor defunta
se voa
não sobe nunca
e só dura
o espaço breve duma nota

Assim o canto se detém imóvel
como se da flauta
falhando súbito
na boca do poeta
ficasse o hiato
ou a saliva
de um tempo devassado por insectos cor de cinza

A voz suspensa e negada
cede a vez à letra amorfa
inscrita no silêncio
com seu peso
de chumbo e olvido
acaba o poema
e um ponto final selando tudo.

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