segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Heloisa Buarque de Hollanda reúne em site 37 novos autores


*do portal Terra Traduzido ao pé da letra, "Enter" significa entrar, ter acesso. Despido de sua oralidade imperativa e posto no ambiente computacional, num simples aperto de teclas, o verbo ganha sentido de comando inicial de funções. No âmbito da escrita, confirma a abertura e apropriação de espaços livres que são transformados em textos e cumpre a função de aventurar seu comandante a uma nova lógica, linguagem e espaço. Para cada "Enter" cravado pelos nomes que compõem a nova antologia virtual coordenada por Heloisa Buarque de Hollanda, a coisa amplia significados: abre-se um clarão de possibilidades poéticas e de expressão da linguagem. E é justo por sua condição de passaporte virtual e abstrato para a criação de novas modalidades para a palavra que Heloisa batiza com o termo um novo site.
"Enter faz você entrar em outro sistema. Tenho certeza que, para pensar a literatura na internet, é imprescindível que cada um pressione a tecla 'enter', analisa. "Não podemos usar os mesmos comandos mentais e teóricos que usamos fora da web. É preciso aceitar o rito de passagem, se permitir entrar em outra lógica de percepção, experimentar novas relações com a palavra, com os autores, com a ideia de literatura na web."

Sob sua curadoria, o espaço virtual, que estará aberto a partir de amanhã, aloca o trabalho textual e audiovisual de 37 novos autores, que variam entre 20 e 40 anos. O marco que diferencia e dá liga original ao projeto, no entanto, é a reunião de escritos cunhados não só por escritores. Os autores selecionados são também atores, músicos, cartunistas, apresentadores de TV, editores, web designers, produtores culturais e ativistas. Entre eles, nomes como Michel Melamed, Nega Gizza, Marcelino Freire, Andre Dahmer, Lirinha, Arnaldo Branco, Rafael Grampá, Sérgio Vaz, Gabriel Bá e Fábio Moon, Ramon Mello, Bruna Beber, Alice Sant'Anna e Omar Salomão.

"O que atrai nesses nomes é a diversidade. É notar a evolução absurda da qualidade dos quadrinhos, que agora são chamados de novelas gráficas. Você observa o rap se declarando hoje como poesia falada. É a palavra rimada, que é a nova categoria dessa música. Há 10 anos, o rap era só rap. Hoje, se apresenta como poesia. Como o GOG, que é um grande poeta", destaca Heloisa. "A antologia observa como todos esses autores encaram e exercitam diferentes práticas da palavra. Assumem essas novas modalidade e as expõem na web e nas ruas. Quero jogar luz sobre todos esses novos formatos que a palavra toma. Isso que é incrível. A palavra, nessas novas formas, se apodera do estatuto da literatura e da prática literária. Isso é muito novo. É um momento de mudança na prática da palavra."

Heloisa explica que o fascínio com o universo da internet reside na potencialidade de práticas literárias diversificadas, não só a literatura. É claro que esta, com seus critérios de valor, qualidade e legitimada na função autor também circula livremente na rede. E mais, se beneficia do painel virtual para ampliar sua visibilidade e acessibilidade, permitida pela natureza aberta e descentralizada do meio eletrônico.

"Não existe uma literatura de internet, mas, sim, práticas literárias na rede, que são diversificadas. E a antologia mostra que o que expandiu foi a palavra. Não foi a literatura do ponto de vista tradicional e canônico. Essa que preza a qualidade e a autoridade continua, e também hospedada na internet. Nunca se falou, escreveu e leu como agora, na internet. O índice de downloads de clássicos é muito alto. Estimulou a escrita e leitura."

Desde a criação dos blogs, o ambiente onde esta escrita se dá modificou-se. É distinto daquele convencionado pela criação literária ou mesmo da escrita de cartas e diários. A situação de privacidade e intimidade que é, em princípio, o ambiente da escrita fora da rede, passa a ser substituído e experimentado como um espaço público, de autoexposição, interlocução e confrontação. Heloisa define a consciência desta exposição como a grande responsável por um dos traços mais atraentes desta nova geração de escritores.

"A autoironia é enorme. A escrita dos blogs é muito encenada. Quem escreve sabe que está assumindo um personagem. E isso desliza. Uma cultura online que migra para a offline e vice-versa. É uma duplicidade. As pessoas vivem nesse limite, que é uma nova forma. Nem lá, nem cá. A encenação do narrador no blog contaminou a escrita. O narrador, literalmente, perdeu a inocência. Anos atrás, ele era um deus. Hoje, ele sabe que é uma versão dele mesmo. E a milhares de caminhos de escrita. Tem até migração de sexo. É muito radical. Você poder ter a versão que quiser de você. Isso invade um comportamento e uma forma de perceber o texto."

Produção intensa na rede
Autor do livro Vinis mofados, que será lançado pela editora Língua Geral, o poeta e jornalista Ramon Mello, também idealizador do blog de entrevistas Click(IN)Versos (www.clickinversos.myblog.com.br), é um dos responsáveis por caçar, na infinidade de endereços virtuais, os novos nomes que compõem a antologia. A sede por descobrir talentosos escritores, ou condutores de palavras, levou-o ao encontro com Heloisa.

"Há uma produção literária muito intensa na rede. Logo após conhecê-la, recebi o convite para embarcar nesta viagem, que resultou em Enter", conta. "Pesquisei mais de 300 autores que tem relação direta com a rede, num trabalho que mistura texto, áudio e vídeo. O momento mais difícil é a seleção final. Muita gente interessante fica de fora. Trata-se de um recorte. Mas a antologia digital tem suas vantagens: novos autores podem ser incluídos, assim como os escolhidos podem ser deletados, para correção de possíveis equívocos. Espero que o projeto desperte o interesse do mercado editorial sobre os jovens autores, uma vez que estão avalizados por uma crítica minuciosa."

www.enterantologiadigital.com.br

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