quinta-feira, 2 de julho de 2009

Flip 2009: um novo pólo para difundir a leitura no país. Leia o "Manifesto por um Brasil literário"


A festa também teve, hoje, seu momento de seriedade. De manhã, abrindo a programação da Flip Casa de Cultura, às 10h, o escritor Bartolomeu Campos de Queirós leu um manifesto por um Brasil literário, em debate que contou com a presença de representantes de diferentes entidades e ONGs ligadas ao estímulo à leitura, além de autoridades, como o diretor de Livro e Leitura do Ministério da Cultura, Fernando dos Santos, a secretária Municipal de Educação do Rio de Janeiro, Cláudia Costin, e o secretário Municipal de Cultura de São Paulo, Carlos Augusto Calil. De concreto, a mesa anunciou a criação do site http://www.brasilliterario.org.br/, em que será possível acompanhar ações de estímulo à leitura no país.Também está circulando em Paraty um livro com o manifesto, para que os interessados possam aderir à causa. A ideia é dar o pontapé para um amplo movimento nacional de estímulo à leitura literária, e a Flip, sobretudo a partir de sua próxima edição, em 2010, deve funcionar como uma caixa de ressonância dessas ações. A Casa Azul, associação que organiza a Flip, é uma das entidades à frente do movimento, que conta com o apoio do Instituto C&A, da Fundação Nacional do Livro e da Leitura (FNLIJ), do Instituto Ecofuturo e do Centro de Cultura Luiz Freire (CCLF). Queirós, no manifesto - cujo audio pode ser visto no novo site - afirma que "a leitura literária é um direito de todos e que ainda não está escrito. O sujeito anseia por conhecimentos e possui a necessidade de estender suas intuições criadoras aos espaços em que convive".

Abaixo, a íntegra do manifesto:

Manifesto por um Brasil literário,
por Bartolomeu Campos de Queirós

O Instituto C&A, se somando às proposições da Associação Casa Azul – organizadora da Festa Literária Internacional de Paraty -, à Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil, ao Instituto Ecofuturo e ao Centro de Cultura Luiz Freire, manifesta sua intenção de concorrer para fazer do País uma sociedade leitora. Reconhecendo o êxito já conferido, nacional e internacionalmente à FLIP, o projeto busca estender às comunidades, atividades mobilizadoras que promovam o exercício da leitura literária.

Reconhecemos como princípio, o direito de todos de participarem da produção também literária. No mundo atual, considera-se a alfabetização como um bem e um direito. Isto se deve ao fato de que com a industrialização as profissões exigem que o trabalhador saiba ler. No passado, os ofícios e ocupações eram transmitidos de pai para filho, sem interferência da escola.

Alfabetizar-se, saber ler e escrever tornaram-se hoje condições imprescindíveis à profissionalização e ao emprego. A escola é um espaço necessário para instrumentalizar o sujeito e facilitar seu ingresso no trabalho. Mas pelo avanço das ciências humanas compreende-se como inerente aos homens e mulheres a necessidade de manifestar e dar corpo às suas capacidades inventivas.

Por outro lado, existe um uso não tão pragmático de escrita e leitura. Numa época em que a oralidade perdeu, em parte, sua força, já não nos postamos diante de narrativas que falavam através da ficção de conteúdos sapienciais, éticos, imaginativos.

É no mundo possível da ficção que o homem se encontra realmente livre para pensar, configurar alternativas, deixar agir a fantasia. Na literatura que, liberto do agir prático e da necessidade, o sujeito viaja por outro mundo possível. Sem preconceitos em sua construção, daí sua possibilidade intrínseca de inclusão, a literatura nos acolhe sem ignorar nossa incompletude.

É o que a literatura oferece e abre a todo aquele que deseja entregar-se à fantasia. Democratiza-se assim o poder de criar, imaginar, recriar, romper o limite do provável. Sua fundação reflexiva possibilita ao leitor dobrar-se sobre si mesmo e estabelecer uma prosa entre o real e o idealizado.

A leitura literária é um direito de todos e que ainda não está escrito. O sujeito anseia por conhecimentos e possui a necessidade de estender suas intuições criadoras aos espaços em que convive. Compreendendo a literatura como capaz de abrir um diálogo subjetivo entre o leitor e a obra, entre o vivido e o sonhado, entre o conhecido e o ainda por conhecer; considerando que este diálogo das diferenças – inerente à literatura – nos confirma como redes de relações; reconhecendo que a maleabilidade do pensamento concorre para a construção de novos desafios para a sociedade; afirmando que a literatura, pela sua configuração, acolhe a todos e concorre para o exercício de um pensamento crítico, ágil e inventivo; compreendendo que a metáfora literária abriga as experiências do leitor e não ignora suas singularidades, que as instituições em pauta confirmam como essencial para o País a concretização de tal projeto.

Outorgando a si mesmo o privilégio de idealizar outro cotidiano em liberdade, e movido pela intimidade maior de sua fantasia, um conhecimento mais amplo e diverso do mundo ganha corpo, e se instala no desejo dos hímens e mulheres promovendo os indivíduos a sujeitos e responsáveis pela sua própria humanidade. De consumidores passa-se a investidores na artesania do mundo. Por ser assim, persegue-se uma sociedade em que a qualidade da existência humana é buscada como um bem inalienável.

Liberdade, espontaneidade, afetividade e fantasia são elementos que fundam a infância. Tais substâncias são também pertinentes à construção literária. Daí, a literatura ser próxima da criança. Possibilitar aos mais jovens acesso ao texto literário é garantir a presença de tais elementos – que inauguram a vida – como essenciais para o seu crescimento. Nesse sentido é indispensável a presença da literatura em todos os espaços por onde circula a infância. Todas as atividades que têm a literatura como objeto central serão promovidas para fazer do País uma sociedade leitora. O apoio de todos que assim compreendem a função literária, a proposição é indispensável. Se é um projeto literário é também uma ação política por sonhar um País mais digno.

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